Tratar e prevenir a dor nas costas: será possível?
DOI:
https://doi.org/10.33233/fb.v2i4.643Resumo
O primeiro registro de algia vertebral (AV) na historia, relatado pelo Dr. Inhotep, ocorreu em um trabalhador que construía uma pirâmide em Sakara, no antigo Egito, em 2748 AC (Hagberg, 1993). Desde então, as AV integram-se, ao longo dos séculos, í historia da Medicina através de inúmeras contribuições literárias e científicas: Hipócrates (460-377, AC), Galenus (130-200), Vesalius (1555), Cotugno (1764), Valleix (1847), Lasegue (1864), Bernhardt (1895), Lindsetd (1920), Lortat, Jacob y Sobareanu (1904), Petrén (1908), Dejerine (1914), Sicard (1918), Heuman (1920), Danforth y Wilson (1925), Putti (1927), Ghormley (1933), Pette y Becker (1938). Atualmente, as algias vertebrais podem ser consideradas como um desastre médico, pois assumiram um perfil de distribuição verdadeiramente epidêmico e, a despeito de sua antiguidade, ainda são, sob ponto de vista etiológico, um grande mistério.
Os nossos conhecimentos atuais na área de anatomo-fisiologia nos permitem observar que a série de vértebras dos discos intervertebrais, dos músculos e dos tendões, dos ligamentos, dos vasos e dos vários tipos de nervos, acabam por formar o conjunto de estruturas que compõem as nossas costas. Todas estas estruturas suportam o nosso peso, protegem o nosso sistema nervoso e nos permitem, ainda, conviver, paradoxalmente, com um sistema biomecânico que evita a telescopagem e nos possibilita uma locomoção eficiente. Nobre e importante função desempenham as nossas costas, ao nos oferecer tantas coisas, desde que, segundo a teoria evolucionista, adotamos a postura bípede. Mas e nós, o que fazemos por elas? As preservamos de cargas compressivas intra discais que, via de regra, extrapolam os limites máximos permitidos? Adotamos hábitos posturais que permitem o equilíbrio entre os segmentos corporais e solicitam harmonicamente o sistema músculo articular? Trabalhamos em um local que nos poupe das agressões ambientais? Controlamos nossas emoções e sentimentos o suficiente para não somatizarmos em nossas costas quaisquer evidências de nossos transtornos psicológicos? Conseguimos viver, sem aborrecimentos, em uma sociedade que longe de ser justa e igualitária, ainda permite que os cinismos e as hipocrisias se associem a providenciais omissões para indultar gente mais esperta e sabida do que nós?
Ao prefaciar o livro "The Back pain revolution", de Gordon Waddell, (Churchill Livinstone ed., 1998), Red Phillips parece definir muito claramente o que realmente temos feito pelas nossas costas, quando afirma: "We have stretched our backs. We have twisted and curled our backs. We have cooked our backs. We have frozen our backs. We have stimuled our backs with electric currents of various sorts, and with ultrasound waves, infrared waves, magnetic waves and X-rays waves. We have rubbed our backs with liniments, spirits, gels, perfumes and poultices". Na verdade, somos obrigados a tratar o sintoma e não a doença.
È bem possível que neste novo século os avanços na área da psico-neuro-endocrinologia, da fisiologia e genética da dor, possam finalmente descobrir o que realmente causa a dor nas costas. Até lá, devemos aceitar o desafio de combater e prevenir esse velho mal que, como o vampiro do romance de Bran Stoker, resiste a todos os ataques e insiste em ser imortal. A diferença entre os casos de mortos retornando para aterrorizar, atacar e matar durante a noite, tão bem descritos no século XII pelo historiador inglês William de Newburgh, e a dor nas costas está no fato de que esta não seleciona como vítima apenas lindas jovens e tampouco restringe seus ataques a períodos noturnos. Ainda no campo das analogias, podemos afirmar, na atualidade, que, se o relacionamento entre vampiro e vítima estava cheio de conotações psico-sexuais, a relação dor nas costas/ paciente interage sob ação de fortes componentes psico-sociogênicos. Não há, portanto, como negligenciar, seja qual for a nossa conduta terapêutica para a dor nas costas, o modelo proposto por Waddel (1992), que considera o paciente como resultado de uma série de conjunções fortemente influenciadas pelo seu entorno social, cultural e psicológico.
De qualquer forma, ainda que essa dor nas costas possa, às vezes, ser minimizada por condutas médicas ou atenuada por protocolos fisioterapêuticos, o seu equacionamento total ainda está longe de tornar-se uma realidade, enquanto a sua verdadeira etiologia permanecer desconhecida.Â
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