A polaridade orador - auditório

Autores

  • Marco Antônio Guimarães da Silva UFFRJ

DOI:

https://doi.org/10.33233/fb.v10i1.1655

Resumo

Há muitos anos atrás, participava como expectador de uma conferência em um congresso de medicina e, durante a sessão de perguntas, contestei uma idéia defendida pelo médico conferencista. Havia vivenciado uma situação na pesquisa que fizera, e essa vivência me serviu de substrato para iniciar uma discussão, a qual acabou por envolver quase que toda a platéia, constituí­da essencialmente por médicos. Minha argumentação acabou por angariar partidários, gerando um certo desconforto entre orador e auditório. Passado o episódio, fiquei com a impressão, sem maiores reflexões, de que aquela confusão entre conferencista e ouvintes havia transformado aquele congresso no mais interessante evento que participei em toda a minha vida acadêmica.

Ao saber que o próximo Congresso Brasileiro de Fisioterapia será organizado na cidade de Rio de Janeiro, volto ao tema, fazendo uma nova leitura da relação orador-auditório, na tentativa de melhor entender o fato ocorrido há 30 anos atrás.

O episódio em si envolveu questões relacionadas a experiências que vivi antes do congresso médico. Tais experiências ampararam minha retórica, o que acabou por gerar uma grande polaridade entre orador e auditório.

Quando Hegel e Heidegger dizem que "A coerência verbal de nossas verdades fí­sicas e metafí­sicas só se conhece retrospectivamente", nos fornecem a chave para entendermos o papel que as experiências vividas no passado exercem nesse processo. Ao discutir, com o conferencista, situações que poderiam ocorrer, prospectivamente, o que eu dizia desse futuro era o produto de uma sí­ntese pessoal apoiada na minha experiência investigatória.

A forma como argumentei, os motivos utilizados para explicar os resultados obtidos e a busca de adesão í  reprodução de resultados futuros constituí­ram minha retórica.

Uma retórica pode ser feita por persuasão ou por convencimento. Para os que desejarem aprofundar o tema, sugiro ler Aristóteles (A Retórica). Ao centrarmos força nos resultados, nosso discurso argumentativo volta-se para a adesão pela persuasão. Quando nos esforçamos por apresentar razões para os resultados que encontramos, nosso discurso argumentativo está a sugerir uma adesão por convencimento.

No caso do médico, a sua exposição estava fundamentada na argumentação pelos resultados, portanto, pela persuasão, sem se preocupar em explicar algumas razões que invalidavam a teoria que ele então apresentava.

Se por um lado o conferencista não foi muito feliz em refutar os argumentos da platéia, há que se reconhecer que a ampla discussão, permitida por ele, sobre o tema, com envolvimento de quase toda a platéia, foi bastante louvável.

O auditório não pode ser encarado como uma comunidade onde o conhecimento deva ser imposto. A polaridade orador-auditório deve ser flexí­vel e apresentar-se como uma seqüência dinâmica de posições de orador e de posições de auditório, intercambiáveis e mútuas, que tornem o resultado do intercâmbio inacabado. Em algumas situações, o orador pode se transformar em auditório e vice-versa. A direção do convencimento pode se inverter e partir do auditório para o orador com um contingente reversí­vel

Esperemos que o espí­rito dos congressistas que virão ao Rio de Janeiro para o Congresso Brasileiro de Fisioterapia, sejam eles auditório ou oradores, esteja aberto í  visão que defendi e reproduzam suas trajetórias e experiências de conhecimento dentro de uma ótica intercambiável.

No mais, gostarí­amos de expressar nosso contentamento por saber que a presidente do congresso e o presidente da comissão cientifica são nossos editores associados.

Biografia do Autor

Marco Antônio Guimarães da Silva, UFFRJ

Médico, D.Sc., Université Lyon II, France

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Publicado

2017-12-16