Carnaval em Paris
DOI:
https://doi.org/10.33233/fb.v10i2.1656Resumo
As notícias que me chegam dão conta de que o calor anda castigando o pessoal no Brasil. Por aqui, em Paris, a temperatura, bem mais agradável, anda na casa de uns poucos graus negativos. Se a temperatura elevada tem esquentado a época carnavalesca no país tropical, o frio daqui tem animado e acirrado os ânimos, substituindo os blocos carnavalescos por protestos e passeatas de rua, fatos já consagrados e integralizados í cultura francesa.
Tive oportunidade de assistir a duas dessas manifestações, as quais refletiam a insatisfação de professores e pesquisadores de universidades e centros de pesquisas diante das alterações ao sistema vigente que o governo pretende fazer. A principal reivindicação dos professores e pesquisadores é pela manutenção do número de aulas que ministram. Na ótica do governo, para que os docentes continuem com o mesmo número de aulas, teriam que apresentar um determinado número de publicações de qualidade. O núcleo da questão parece estar na forma de como essa qualidade seria medida. Ao que tudo indica, nem o governo e tampouco professores sabem ainda como medir a tal qualidade exigida e dizer o número ideal de publicações que cada docente teria que produzir.
Algumas áreas do conhecimento, notadamente em ciências exatas, exigem tempo de pesquisa que podem alcançar vários anos até que se produzam resultados. As publicações nessas áreas, como conseqüência, também seriam mais espaçadas e em menor numero, sem diminuir o mérito dos investigadores.
E no Brasil? Como está a situação com relação ao tema? No âmbito dos cursos strictu sensu ( mestrados e doutorados), a CAPES colocava, pelo menos até o ano de 2005, ano que deixei a carreira docente em curso de mestrado no Brasil, a exigência de 02 publicações anuais, por professor, em revistas classificadas por eles como Qualis A ou Qualis B. Sabe-se que a qualidade de muitos desses artigos, ainda que veiculados em revistas de impacto, deixam muitíssimo a desejar, pela ausência de evidências.
Ainda que haja um plano de avaliação docente para as áreas de graduação e especialização, os professores podem atingir a pontuação exigida para ascensão profissional, sem que necessariamente tenham realizado pesquisa ou publicado algum artigo. Nesses casos, são contabilizados a docência e as atividades burocrático-administrativas.
Sabemos, todos os que estamos ha pelo menos 30 anos em universidade federal, que há professores com excelência didático-pedagógica que não têm vocação para pesquisa e professores que são ótimos pesquisadores, mas que efetivamente não se sentem confortáveis em uma sala de aula. Diriam os críticos: se é professor, tem que fazer um curso de didática e dar aula.
Sempre defendi a idéia de que, se em um departamento ha equilíbrio numérico entre os que preferem dar aulas e os que optam pela investigação cientifica, esses últimos, apos a conclusão de suas pesquisas, exporiam seus resultados para os que estão com a responsabilidade de aula, através de seminários e através das publicações. Os professores com responsabilidade didática poderiam levar esses resultados para os seus alunos em sala de aula, adaptando e renovando o conteúdo de sua disciplina às circunstancialidades das conclusões que o pesquisador obteve em seu trabalho. Finalmente, pesquisadores, professores e alunos aplicariam, sempre que possível, na comunidade os benefícios demonstrados pela investigação.
A integração obtida com o modelo acima exposto, alem de gerar publicações, atenderia, de forma integralizada, ao tão propagado esteio universitário ensino, pesquisa e extensão.
O carnaval já terá acabado, quando esse editorial chegar a você, e os blocos já terão se recolhido ao seu repouso anual, e eu já terei retornado. Os protestos e passeatas na França continuarão. Por aqui, na terra de Cabral, tudo continuará como dantes no quartel d'Abrantes.
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